Conflitos no campo crescem 10% em 2022, aponta relatório apresentado na Alece

 Foto: Marcos Moura

Texto: Divulgação

Os conflitos no campo cresceram 10,39% no País em 2022, quando foram registrados 2.018 casos – em 2021, foram 1.828 situações desse tipo computadas. Os dados foram apresentados durante o lançamento do relatório de 2022 do “Conflitos no Campo no Brasil“, elaborado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), que ocorreu em audiência pública promovida pela Comissão de Direitos Humanos e Cidadania (CDHC) da Alece  na tarde desta quinta-feira (22/06).

O presidente da CDHC, deputado Renato Roseno (Psol), elogiou o trabalho desempenhado pela CPT ao longo de décadas de atuação. “A CPT nasce no Brasil, esse País absurdamente desigual e que até hoje não cumpriu o desafio de fazer a reforma agrária”, lamentou. Ele ainda criticou os ataques às populações tradicionais, indígenas, quilombolas e litorâneas.

De acordo com o coordenador regional da CPT/CE, Claudiano Sobral, o relatório reitera “o caráter violento do latifúndio e de outras atividades econômicas do campo, como mineração, garimpo ilegal e grandes projetos de energia”. Ele avaliou os números registrados nos últimos anos como “assustadores” e defendeu que a violência no campo seja “discutida e enfrentada por toda a sociedade”.

O coordenador executivo da Associação Escola Família Agrícola Jaguaribana, Thiago Valentim, apresentou na audiência os principais dados do relatório. Um dos que chamou a atenção foi o crescimento de 272,73% em tentativas de assassinatos no campo no Brasil, que pularam de 33 (2021) para 123 casos (2022). Já o número de assassinatos registrou o aumento de 30,56%, subindo de 36 (2021) para 47 casos (2022). Para ele, é fundamental “disponibilizar para sociedade brasileira e internacional um documento tão importante para entender os conflitos na terra no Brasil”.

Já no Ceará, foram registrados 12 conflitos em 2022, sendo 10 conflitos por terra e dois em razão de trabalho escravo rural. No Estado, segundo Thiago Valentim, os conflitos envolvem indígenas, quilombolas, sem terras e pescadores artesanais. O relatório é dividido nos seguintes eixos: Conflitos no Campo; Violência contra a Pessoa; Conflitos por Terra; Conflitos por Água; Conflitos Trabalhistas / Trabalho Escravo Rural; e Manifestações de Luta.

O representante do Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB), Samuel Olimpio de Oliveira, falou sobre os conflitos em relação à água. “É importante entender que a nível mundial existe uma grande disputa pelos recursos naturais”, alertou ele, que colocou a água como uma questão central em um contexto de mudanças climáticas e transição energética.

No Ceará, ele criticou as desigualdades no acesso à água e citou o caso do Açude Castanhão, o maior do Estado e responsável por abastecer a Região Metropolitana de Fortaleza. “As famílias atingidas pela barragem não têm acesso à água para produzir ou beber (…) Isso é uma contradição flagrante”, comentou.

A professora da rede de ensino básica e doutora em Geografia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), Rosilene Aires, pontuou que “estamos diante de uma denúncia grave que mostra esse cenário violento e conflituoso que o campo brasileiro apresenta.” Ela criticou ainda a inação do estado brasileiro em elaborar políticas públicas para resolver o problema e ponderou que os dados do relatório deveriam ser utilizados para balizar a atuação estatal.

Já o professor do curso de Economia da UFC, André Ferreira, abordou os impactos da mineração na vida das comunidades rurais. Ele informou que houve um crescimento de 400% na extração de minérios no Ceará entre 2013 e 2021 e isso ocorre em “um contexto de injustiça ambiental”. Além disso, ele lembrou que os atingidos pelos empreendimentos não têm o direito de participar dos debates sobre a implantação dos projetos. “O número de trabalhadores tem aumentado muito nesse segmento e são altamente precarizados”, acrescentou André Ferreira. Ele ainda citou o caso da extração de urânio em Santa Quitéria que atingiu de forma negativa a economia popular da região.

Para a agente da CPT em Sobral e integrante da Comunidade Quilombola Batoque Pacujá, Joseli do Nascimento Cordeiro, “um dos maiores violadores dos povos e comunidades tradicionais e originários é o Estado”. Ela defendeu ainda que as vidas perdidas no campo deixem de ser apenas números e que essas histórias sejam contadas. “(Essas vítimas) tinham objetivos, sonhos e, sobretudo, lutas. E essa luta continua”, asseverou.

Na avaliação da representante da Pastoral da Juventude Rural, Ana Sabrina Araújo Meneses, é preciso garantir “vida digna e trabalho na nossa terra (…) A gente quer reforma agrária popular”. Para isso, ela pediu o acesso a direitos básicos, como saúde, educação, alimentação e cultura.

Na opinião do presidente do Instituto do Desenvolvimento Agrário do Ceará (Idace), João Alfredo Telles Melo, é preciso também debater a situação de comunidades atingidas por empreendimentos ligados à produção de energia eólica. Ele ainda informou que o órgão criou um grupo de trabalho (GT) de conflitos fundiários envolvendo povos e comunidades tradicionais a fim de contribuir com informações que ajudem no processo de demarcação dessas terras. “Esse GT está levantando todos os conflitos que já chegaram ao Idace”, adiantou.

João Alfredo revelou ainda que foi criado um GT interinstitucional para apoiar os povos e comunidades tradicionais e que, junto com a Fundação Nacional do Índio (Funai), está contribuindo com o processo de demarcação das terras das etnias Jenipapo-Kanindé, Pitaguary, Tapeba e Tremembé.

E a advogada Ingrid Viana, representante do deputado Missias Dias (PT), garantiu que o mandato está de portas abertas para articular discussões sobre o tema e atender “demandas dos movimentos e comunidades”. Ela ainda defendeu que as políticas públicas devem ser retomadas e repensadas para combater a violência no campo. 

Fonte da Matéria:https://www.al.ce.gov.br

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