Projeto Re-Ciclo contribui para melhoria da qualidade de vida de catadores e expansão da reciclagem de resíduos na Capital

Iniciativa pioneira da Prefeitura já entregou 22 triciclos para catadores de 13 associações. Duas delas contam com sistema de agendamento online de coleta desde setembro de 2022

Fotos: Rodrigo Carvalho

João Batista de Souza saía do Grande Bom Jardim por volta das 15 horas, puxando uma carroça de ferro, e caminhava por aproximadamente duas horas sob o calor fortalezense até chegar ao Montese, onde coleta resíduos recicláveis. O trabalho entrava pela madrugada e era concluído na manhã do dia seguinte, após a separação dos materiais retirados do lixo. Desde 2021, o percurso se tornou mais leve e menos exposto ao sol e à chuva. A Associação de Catadores de Material Reciclado do Grande Bom Jardim (Ascabomja) recebeu da Prefeitura de Fortaleza dois triciclos elétricos para a realização das coletas.

A iniciativa faz parte do projeto Re-Ciclo, lançado de forma piloto no ano passado, com a distribuição de 18 triciclos. Em setembro deste ano, o projeto foi ampliado, com a entrega de outros quatro veículos. Também houve a implantação, em parceria com o Ifood e a Startup Solos, de um sistema de agendamento de coleta seletiva para duas associações parceiras, cujos integrantes recebem remuneração fixa de um salário mínimo, auxílio alimentação e vale transporte. Há perspectiva de ampliação do projeto para todos os bairros da cidade, o que possibilitaria o alcance de uma taxa de reciclagem de 50% em oito anos. Atualmente são atendidos porta a porta os bairros: Centro, Praia de Iracema, Meireles, Varjota e Mucuripe, e administradores de comércios e residências podem solicitar o serviço de coleta seletiva diretamente no site do Re-ciclo.

“Depois que veio o triciclo, melhorou muito. Às vezes eu saio daqui 17h, 17h30, vou pro bairro do Montese e quando é 22h já estou em casa”, descreve João Batista. Para além da economia de tempo, a mudança tem impacto na saúde. “Eu voltava para casa com o espinhaço todo quebrado mesmo, todo dolorido, sempre sentia dor de cabeça, moleza, febre. Agora não”, afirma, ressaltando que o esforço é menor, mas a produção aumentou.

antônia posa para foto dentro da associação de catadores do bom jardim
Segundo Antonia de Souza, a produção aumenta por volta dos 30% com o triciclo

Segundo a presidente da Ascabomja, Antonia de Souza, com o triciclo, a produção dos catadores da associação aumenta por volta dos 30% e em alguns casos chega a dobrar. Os veículos são revezados entre os 37 integrantes, contribuindo para melhorar as condições de trabalho de todos.

“Força mesmo a gente faz só a de botar o material em cima e de descarregar na hora que chega, mas é um trabalho que já é bem mais ágil que quando era no carrinho”, explica Antônia.

Os triciclos elétricos têm pedal assistido, potência máxima de 350 watts, autonomia de 30 km e chegam a alcançar 25 km/h. A eficiência na coleta resulta em maiores quantidades de material reciclável e coloca Fortaleza como destaque na atuação do aumento de reciclagem de resíduos. Atualmente, o índice é de quase 9%, acima da média do País, que é de cerca de 4%.

Nas ruas, os triciclos chamam atenção, animando as pessoas a fazerem coleta seletiva e entregarem o material para os catadores. O gesto se torna hábito, com data e hora de coleta marcados. “Já tem uma padaria em que uma catadora nossa vai buscar (os recicláveis) duas vezes na semana. Tem um colégio que de vez em quando liga pra gente ir buscar material. Tem outros pontos que juntam sabendo que aquele catador vai passar e chamam”, exemplifica a presidente da Ascabomja. A colaboração com os catadores se traduz em sustentabilidade ambiental e social ao proporcionar o aumento das reciclagens, a melhoria das condições de trabalho e a expansão da renda dos catadores.

No Grande Bom Jardim e no Montese, onde os catadores da Ascabomja realizam coleta, a passagem do triciclo tem trilha sonora. “Eu botei uma caixa de som, que vem tocando a música do Re-Ciclo, orientando o pessoal como separar o material reciclado e como doar ao catador,” conta João Batista. E o reclame do projeto funciona: “Quando a gente passa, o pessoal vê a caixa de som tocando, me chama e me entrega o material”.

Coletas agendadas

A sistematização de coletas de porta em porta, com data e hora marcadas, realizada de forma autônoma por associações como a Ascabomja, é um dos objetivos da segunda etapa do Re-Ciclo. O projeto tem duas fases principais, a primeira consistiu na entrega dos triciclos e equipamentos de proteção individual (EPIs) e na realização de treinamentos para os integrantes das associações de catadores credenciadas pela Prefeitura na ocasião. A iniciativa foi viabilizada pelo prêmio de R$ 1 milhão que Fortaleza recebeu do Desafio Global de Mobilidade Urbana 2019, organizado pela Transformative Urban Mobility Initiative (TUMI), e nasceu da parceria entre a Agência Alemã de Cooperação (GIZ) e o Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF).

A segunda fase, em execução desde setembro deste ano, conta com parceria do iFood e execução da startup Solos, que traz o primeiro modelo de inovação aberta do País para a coleta de recicláveis. “Essa startup opera a relação entre associações que estão credenciadas no projeto Re-Ciclo e que têm os ecopontos como local de apoio, e fazem também esse agendamento do residente que deseja separar o seu reciclável e entregar, com o catador que faz a coleta com o triciclo”, explica Taís Costa, coordenadora do Laboratório de Inovação de Fortaleza (Labifor), que faz parte da Fundação de Ciência, Tecnologia e Inovação de Fortaleza (Citinova), onde o projeto foi concebido.
“Tem uma equipe só para dar assistência com os materiais, pra conseguir que as pessoas doem nos apartamentos e estabelecimentos. A gente sai só pra ir pegar os materiais nos locais determinados,” detalha Paulo Lima, catador há dez anos e integrante da associação Asca-Rosa. Para ele, a sistematização melhorou em 100% a rotina de trabalho.

Além da Asca-Rosa, também é contemplada pela segunda fase do Re-Ciclo a associação Moura Brasil, da qual faz parte Raquel Aires, de 34 anos, catadora há sete anos. “Com a coleta mais organizada a gente não precisa ficar catando na rua, abrindo os sacos. Já recebemos as doações direitinho, separadas, mais limpas, o material não é mais sujo e a renda da gente aumentou muito”, celebra ela, calculando ter em média 50 coletas agendadas para realizar por semana.

A etapa atual do projeto inclui também a remuneração dos catadores com um salário mínimo, auxílio alimentação e transporte. Caso batam as metas de coleta diária, os profissionais participantes recebem um incremento nessa renda. Para Taís Costa, o retorno financeiro fixo representa uma grande inovação, um pioneirismo de Fortaleza e contribui para o reconhecimento dos catadores como “agentes de sustentabilidade, que trabalham fazendo um serviço importantíssimo tanto para o meio ambiente quanto para as cidades, separando os resíduos para que possam ser reutilizados ou reciclados”.

Com a combinação entre o uso dos triciclos elétricos, o sistema de agendamento de coletas e a dinâmica de remuneração mensal, as associações que estão na segunda fase do Re-Ciclo já coletaram mais de 30 toneladas de recicláveis desde setembro de 2022. A meta da Prefeitura é avaliar os resultados e ampliar o projeto para todos os bairros da cidade, atingindo uma taxa de reciclagem de 50% em oito anos. “Queremos nos tornar a cidade que mais recicla mas também reduz desigualdades com a inserção dos catadores nessa economia”, aponta Taís.

O Re-Ciclo é coordenado pela Citinova e executado pela Secretaria Municipal da Gestão Regional (Seger), em parceria com a Autarquia de Regulação, Fiscalização e Controle dos Serviços Públicos de Saneamento Ambiental (Acfor), a Regional 2, a Regional Centro e a Secretaria da Conservação e Serviços Públicos (SCSP).

Fonte:https://www.fortaleza.ce.gov.br

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